Esse é o entendimento da maioria da 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
A alegação de legítima defesa só é válida se houver agressão de fato ou sua ameaça concreta. Por isso, a maioria da 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou Apelação de um policial rodoviário federal condenado a três anos de reclusão por disparar sua arma contra um carro que furou a barreira de fiscalização numa rodovia do Rio Grande do Sul em 2013. A pena privativa de liberdade foi substituída por restritivas de direitos.
Segundo a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal, o policial rodoviário fez um único disparo de espingarda calibre .12 contra um automóvel que passou por toda a barreira de policiais, sem atender a ordem de parada. A bala perfurou o veículo e ficou incrustada a poucos centímetros da cadeira em que estava a filha do motorista.
Como o tiro foi disparado quando o motorista já estava em rota de fuga, o policial foi denunciado como incurso nas sanções do artigo 15 combinado com o artigo 20, ambos da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) — disparo de arma de fogo na via pública feito por servidor da área da segurança.
No primeiro grau, a denúncia foi julgada procedente pela 5ª Vara Federal de Caxias do Sul. O juiz-substituto Rafael Farinatti Aymone entendeu que o acusado agiu de forma totalmente contrária ao disposto na Portaria Interministerial 4.226/2010, que estabelece diretrizes para o uso da força por agentes da segurança pública.
“Não é legítimo o uso de armas de fogo contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, a não ser que o ato represente um risco imediato de morte ou lesão grave aos agentes de segurança pública ou terceiros”, diz a norma em seu item 5 do anexo 1.
Sem motivo
Para o juiz, segundo as testemunhas, ficou claro que a situação não oferecia maiores riscos aos policiais, não exigindo o emprego de arma de fogo. Prova que o veículo não oferecia risco grave é o ângulo do tiro, que atingiu a lataria na altura do pneu traseiro. Ou seja, quando o carro já estava passando pela posição em que se encontrava o réu.
“Dessa forma, estando comprovadas a materialidade e a autoria delitiva, bem como a presença do dolo, não havendo excludentes de ilicitude ou culpabilidade, impõe-se a condenação do réu pela prática da infração penal prevista no art. 15 c/c art. 20, ambos da Lei nº 10.826/03”, definiu na sentença.
Na corte, o relator da Apelação, desembargador Márcio Antônio Rocha, também rebateu tese de excludente da ilicitude e da culpabilidade. A defesa sustentou que o carro teria sido lançado contra os policiais e, por este motivo, o réu atirou contra ele na intenção de pará-lo, defendendo-se da agressão.
“A prova constante dos autos não conforta esse argumento. Pelo contrário, do contexto probatório, verifico que não foi apresentada justificativa a motivar a ação policial, senão o fato de o condutor do veículo não ter observado a parada na blitz que se encontrava em curso’’, explicou.
Por fim, o relator citou a Lei 13.060/2014, que disciplina o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública. Em síntese, a lei diz que o direito à vida deve preponderar sobre o dever de parada em barreira policial.
Divergência
O voto divergente foi encaminhado pela desembargadora Cláudia Cristina Cristofani, que fez questão de ressaltar a conduta do motorista do veículo. “Ele [o motorista] foi fazendo loucuras, ultrapassando na contramão, jogando veículos para um lado e para o outro; os veículos em sentido contrário tinham que [se] jogar pro acostamento”.
Segundo anotou no voto, outro policial testemunhou o motorista tirar um caminhão da pista, porque estava na contramão. Um terceiro colega afirmou que precisou se desviar do veículo quando este acelerou, pois poderia ter sido atropelado.
Segundo a desembargadora, o comportamento do motorista denota total descaso com o perigo, pois colocou em risco a si próprio, a sua filha e aos demais que circulavam na rodovia, incluindo os próprios policiais. Ela observou que a desobediência à ordem de parada permitiu supor tratar-se de alguém perigoso ou que tenha acabado de cometer um crime.
Do Conjur
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